Amanhece em cinza
O dia.
Brisa marinha?
Não, são as gaivotas
Em ronda
pelos restos espalhados da feira do outro dia.
Feira do Relógio
Áspera agonia da cidade.
Os prédios rasgados em blocos
Perfuram em quadrados o céu triste
Levam o olhar à sujidade do largo
Tão inóspito
Nem sequer é um largo
É mancha de alcatrão e pó
Sem passeios nem rumo
Que acolham os transeuntes...
Ali ninguém passa nem passeia
- ou ficam ou fogem ou morrem...
Não se vive.
As ruas levam a “Zonas”.
Todos os bairros se distinguem por uma letra do alfabeto.
Todos iguais até Marvila
Excepto a Zona Jota.
Ali
Naquele largo que não é largo
Lugar disforme onde a feira grita
Voam sacos, papeis
E as gaivotas suaves em torno de restos de comida.
O olhar escapa
E ao longe
- que belo teria sido!
Como numa pintura bolorenta
Onde ainda brilha um canto de cor
Espreita o rio
E o sol que o ilumina,
A Outra Banda e a Serra
Já quase em despedida...
Os blocos de betão
Onde o negrume disforme da estrada leva
E o tal largo...
Traineira ao largo à guarda das gaivotas
Que nas segundas feiras ali gritam.
« - Bem sei que podem perseguir-me, arrancar-me os olhos, torcer-me as orelhas, transformar-me em lagarto, em morcego, em aranha, em lacrau! Mas juro que não hei-de ser infeliz PORQUE NÃO QUERO.» [Aventuras de João Sem Medo - Panfleto Mágico em forma de Romance, José Gomes Ferreira] «Fica a saber claramente:não trocaria a minha desgraça pela tua servidão.» [Fala de Prometeu, em Prometeu Agrilhoado, Ésquilo]
segunda-feira, 9 de junho de 2008
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