segunda-feira, 31 de maio de 2010

A electricidade corre nas veias das casas.
As casas de hoje estão cheias de veias rente aos muros e sob os móveis, como que num corpo que respira.
As casas têm vida electrizada e tudo se acende e pisca. Luzinhas minúsculas verdes, vermelhas e amarelas dizem que as casas estão vivas e dentro delas movem-se seres que acendem e apagam, ligam e desligam, aquecem e arrefecem aparelhos que são o pulsar da vida moderna.
Na vida moderna as casas parecem óvnis, aqueles dos filmes da infância da ficção científica que parecia tão longe que nunca a viveríamos.
As casas de hoje são a ficção científica da nossa infância. As casas de hoje são adultas e têm veias cheias de electricidade. E as crianças de hoje, sem as veias que correm pelas casas, julgariam as salas mudas.
31/05/2010
Rk
Uma fotografia regista aquela fracção de segundo que fica imediatamente colada ao passado.
E desse passado fica-nos a memória, incompleta mas viva, das sensações indeléveis que o momento nos doou: os odores, as paixões, as cores, as palavras, um sorriso, um toque.
E essa memória vai sendo constantemente regenerada pela capacidade que temos de criar; de tornarmos os bons momentos ainda melhores, e os maus em horríveis, ou esquecer.
A fotografia cristaliza a imagem. A memória desenvolve-a, recria, nutre-a.
E de um tópico, que é a imagem, devolvemo-nos a história.
Ando à procura de uma memória que tenho na memória. Ando à procura de uma fotografia que sonhei.
31/05/2010
Rk

Se

E se
Uma sombra vaga mingua
O fim de um lago em abismo
Uma serra tão antiga se resvala

Se
De um raio de Sol se queda água
De um Verão pleno neva a alma
De um Não te asseveras

E
Um Adeus regressa
De um Sorriso a raiva
Do Amor a praga

E se
Um dia não te Perdes
Não te Sentes
Não Vagueias

E te Descobres

31/05/2010
Rk

quinta-feira, 27 de maio de 2010

O silêncio do mar

Que encanto
Quando convivíamos com sereias e tritões
E os nossos mares tinham as partidas
Que eles guardavam

E os marinheiros neles confessavam
E partiam

Quando os pescadores atentos
Escondiam o pescado
Que, por malandrice, os homens-marinhos lhe roubavam

Quando o camponês nas infindáveis horas da labuta
A estancava, não pelo descanso desejado, mas pelo cantar doce da sereia

E no pomar fecundo, pela madrugada, já se lamentava
Pela falta dos frutos já prontos prá colheita
Que jovens tritões à beira-mar
Saboreavam

Sabia-se muito bem que dormiam sobre as rochas
E brincavam na areia durante o amanhecer

E que alguns se acomodaram à vida dos homens
Outros pereceram no mar do silêncio.

E a sereia nunca mais cantou.

Raquel
27/05/10