quinta-feira, 29 de abril de 2010

Dedicatória

«Vinde Ilusões! Da vida, na manhã,
Como amava fixar vosso inconstante afã!
É essa uma vaidade que ainda me interessa.
Aproximem-se!... Bem; tudo se anima e apressa
Por cima da neblina e num mais vasto mundo,
Meu coração, mais novo, aspira mais depressa
O sopro da magia em torno a vós, profundo.

Dos belos dias idos eu distingo as imagens,
E muita sombra querida vem para mim, dos céus;
Fogo reanimado atravessando idades,
O amor e a amizade repovoam lugares.
Mas o desgosto segue-os; nas nossas casas tristes,
Nunca a alegria esteve a não ser por metades...
Vêm lembrar aqueles que nas amáveis horas
Levados pela morte deixaram bons amigos.
Aquela voz que amavam ressoa com ternura,
Mas não pode chegar aos mortos que procura;
Eu perdi da amizade a atenção benévola,
E o meu primeiro orgulho, e os primeiros acordes!
Minhas canções só falam a ignotas multidões,
Mas os aplausos são vazios de intenções,
E se em mim a alegria por vezes foi sentida,
Parecia vaguear na terra destruída.
Um desejo esquecido, que quer voltar a ser,
Vem, numa longa paz, minha alma comover;
Mas, inarticulado, o meu canto parece
Ser o de um alaúde onde a brisa estremece.
Sinto-me emocionado: não de lágrimas novas,
A noite da minha alma tornou-se menos triste;
Dos meus dias de outrora reviveram as trovas,
E aquilo que não é, para mim ainda existe.»
Fausto, Goethe.